quarta-feira, 28 de julho de 2010

O Mito da Caverna

O Mito da Caverna narrado por Platão no livro VII do Republica
é, talvez, uma das mais poderosas metáforas imaginadas pela filosofia,
em qualquer tempo, para descrever a situação geral em que se encontra a
humanidade. Para o filósofo, todos nós estamos condenados a ver sombras
a nossa frente e tomá-las como verdadeiras. Essa poderosa crítica à
condição dos homens, escrita há quase 2500 anos atrás, inspirou e ainda
inspira inúmeras reflexões pelos tempos a fora. A mais recente delas é
o livro de José Saramago A Caverna.
Imaginemos uma caverna subterrânea onde, desde a infância, geração após
geração, seres humanos estão aprisionados. Suas pernas e seus pescoços
estão algemados de tal modo que são forçados a permanecer sempre no
mesmo lugar e a olhar apenas a frente, não podendo girar a cabaça nem
para trás nem para os lados. A entrada da caverna permite que alguma
luz exterior ali penetre, de modo que se possa, na semi-obscuridade,
enxergar o que se passa no interior.
A luz que ali entra provém de uma imensa a alta fogueira externa. Entre
ele e os prisioneiros – no exterior, portanto – há um caminho
ascendente ao longo do qual foi erguida uma mureta, como se fosse a
parte fronteira de um palco de marionetes. Ao longo dessa mureta-palco,
homens transportam estatuetas de todo tipo, com figuras de seres
humanos, animais e todas as coisas.
Por causa da luz da fogueira e da posição ocupada por ela os
prisioneiros enxergam na parede no fundo da caverna as sombras das
estatuetas transportadas, mas sem poderem ver as próprias estatuetas,
nem os homens que as transportam.
Como jamais viram outra coisa, os prisioneiros imaginavam que as
sombras vistas são as próprias coisas. Ou seja, não podem saber que são
sombras, nem podem saber que são imagens (estatuetas de coisas), nem
que há outros seres humanos reais fora da caverna. Também não podem
saber que enxergam porque há a fogueira e a luz no exterior e imaginam
que toda a luminosidade possível é a que reina na caverna.
Que aconteceria, indaga Platão, se alguém libertasse os prisioneiros?
Que faria um prisioneiro libertado? Em primeiro lugar, olharia toda a
caverna, veria os outros seres humanos, a mureta, as estatuetas e a
fogueira. Embora dolorido pelos anos de imobilidade, começaria a
caminhar, dirigindo-se à entrada da caverna e, deparando com o caminho
ascendente, nele adentraria.
Num primeiro momento ficaria completamente cego, pois a fogueira na
verdade é a luz do sol e ele ficaria inteiramente ofuscado por ela.
Depois, acostumando-se com a claridade, veria os homens que transportam
as estatuetas e, prosseguindo no caminho, enxergaria as próprias
coisas, descobrindo que, durante toda a sua vida, não vira senão sombra
de imagens (as sombras das estatuetas projetadas no fundo da caverna) e
que somente agora está contemplando a própria realidade.
Libertado e conhecedor do mundo, o prisioneiro regressaria à caverna,
ficaria desnorteado pela escuridão, contaria aos outros o que viu e
tentaria libertá-los.
Que lhe aconteceria nesse retorno? Os demais prisioneiros zombariam
dele, não acreditariam em suas palavras e, se não conseguissem
silenciá-lo com suas caçoadas, tentariam fazê-lo espancando-o e, se
mesmo assim, ele teimasse em afirmar o que viu e os convidasse a sair
da caverna, certamente acabariam por matá-lo. Mas, quem sabe alguns
poderiam ouvi-lo e, contra a vontade dos demais, também decidissem sair
da caverna rumo à realidade.
O que é a caverna? O mundo em que vivemos. Que são as sombras das
estatuetas? As coisas materiais e sensoriais que percebemos. Quem é o
prisioneiro que se liberta e sai da caverna? O filósofo. O que é a luz
exterior do sol? A luz da verdade. O que é o mundo exterior? O mundo
das idéias verdadeiras ou da verdadeira realidade. Qual o instrumento
que liberta o filósofo e com o qual ele deseja libertar os outros
prisioneiros? A dialética. O que é a visão do mundo real iluminado? A
Filosofia. Por que os prisioneiros zombam, espancam e matam o filósofo
(Platão está se referindo à condenação de Sócrates à morte pela
assembléia ateniense)? Porque imaginam que o mundo sensível é o mundo
real e o único verdadeiro.

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